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sexta-feira, 12 de outubro de 2012

O filho do jardineiro



Nos jardins de Keukenhof, o filho do jardineiro se enternecia pela tulipa adoecida que segurava nas mãos:
- Meu pai, que bonita, mas está doente!

O pai, simples, mas experiente; inculto, mas sensível; rude, mas amoroso, percebeu a estrela da perplexidade que se acendia no coração do menino e principiou a seguinte história:

- Tulipas, meu filho, são a lembrança da minha vida, mas elas próprias têm memória curta; são lindas de se ver, mas elas mesmas pouco adiante enxergam.

Havia, distante daqui, um local de terras planas, uma imensa campina. Os olhos não conseguiam ver onde terminavam, nem onde começavam. Era cercada de montanhas férteis, mas no solo dessa campina, nenhuma planta crescia, porque ele era árido. Nada por lá brotava.

Segundo contam, na escuridão de uma única noite, um jardineiro, que ninguém jamais viu, nem sabe de onde veio, conseguiu semear tulipas por toda aquela enorme área. Como ele fez isso, é desconhecido. Ainda hoje é mistério. O que importa é que as sementes lá ficaram. Mas, como tudo que antes se tentou plantar naquela campina, não brotaram.

Quem conta essa história jura: o jardineiro, vendo malograda sua esperança, não se conformou! Chorou por cinco dias e cinco noites. Suas lágrimas de desespero, então, caíram como tempestade sobre as montanhas férteis e sobre a campina. E o seu descontentamento caiu como relâmpagos por toda aquela extensão.

Depois disso, meu filho, quando o jardineiro estancou suas lágrimas, como que por milagre, todas as tulipas haviam florescido, todas nasceram maravilhosamente belas, de uma só cor. A alegria desse encantado jardineiro se estampou, então, no céu da campina, como um maravilhoso e duradouro arco-iris.

Do destino do jardineiro, nunca se soube. Dizem que ele subiu ao alto das montanhas e lá vive ainda hoje; se as tulipas perdem a cor ou a vitalidade, como esta que tens em tuas mãos, ele chora, e com seu choro advém nova tempestade; suas lágrimas revitalizam as tulipas e, ao vê-las resplandescer novamente, sua felicidade, invariavelmente, orna os céus com a beleza daquele mesmo arco-iris fulgurante do primeiro dia.

Mas, como eu dizia, as tulipas pouco enxergam, e, também, pouco lembram. Durante todos os anos, desde que nasceram pela primeira vez, nunca lhes faltou a chuva revigorante, nem a paz que a sucede. O que acontece, no entanto, é que, ao vir da chuva torrencial, da tormenta e dos relâmpagos, as tulipas se desesperam como crianças. Gritam, esperneiam e choram. Não percebem que seu choro de desespero faz escurecer ainda mais a noite e aumenta o terror da tempestade!

E, ao amanhecer do dia, já banhadas pela luz do arco-iris, as pobres tulipas, tão belas, mas tão cegas e tão esquecidas, nem se lembram que, desde o princípio, só florescem e se tornam belas quando passam pela tempestade...

Gilberto de Almeida
12/10/2012

4 comentários:

  1. Lindo!! De grande sensibilidade, meu caro poeta!

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    1. Gentileza sua, cara poetisa! Sei que você é generosa, até nos comentários!

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  2. Gilberto, o seu conto é absolutamente perfeito! Adorei a história. Sensível, doce e com um profundo sentido. Adorei o ritmo. A leitura pareceu música!
    Parabéns!

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  3. Agradeço muito seu entusiasmo, Dulce. Espero que esse gosto que tenho por escrever continue trazendo um pouco de música para os olhos das pessoas.

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